Conquista para pauta da mobilidade a pé: Estatuto do Pedestre é regulamentado em São Paulo

Como Anda
4 min readAug 27, 2020
A regulamentação recente do Estatuto do Pedestre é uma conquista a ser celebrada pela sociedade paulistana.

No último dia 08/08/2020, Dia Internacional do Pedestre, o Estatuto do Pedestre foi Regulamentado em São Paulo. Essa conquista aconteceu três anos após o, então Estatuto, ter sido sancionado — ou seja, aprovado — na Câmara Municipal.

Há três anos (08/08/2017), o Como Anda promoveu com apoio do Instituto Clima e Sociedade,um encontro para discutir as oportunidades e desafios que o Estatuto trazia para cidades brasileiras. A transmissão online do evento permitiu que o debate tivesse alcance nacional, assim repercutindo a relevância dessa conquista sob a perspectiva de atores que influenciam e participam das tomadas de decisões relacionadas aos marcos regulatórios municipais. A discussão ganhou amplitude através de cidades que se inspiraram no caso paulistano e também já estavam desenvolvendo Projetos de Leis similares, como: São José dos Campos (SP), Goiânia (GO) , Balneário Camboriú (SC), Porto Alegre (RS), Belém (PA), Belo Horizonte (BH), Feira de Santana (BA), Osasco (SP) e Rio de Janeiro (RJ).

A regulamentação recente do Estatuto do Pedestre é uma conquista a ser celebrada pela sociedade paulistana, como uma parte do reconhecimento e construção de um arcabouço legal que deve valorizar e assegurar prioridade, segurança e qualidade para deslocamentos de pedestres, dentro de todo o sistema de mobilidade urbana da cidade — condições já previstas na Política Nacional de Mobilidade Urbana desde 2012 — mas muito raramente respeitadas. A lei reafirma o deslocamento a pé como meio de transporte na cidade e além de celebrar essa conquista, precisamos seguir acompanhando, colaborando — e cobrando — para que as medidas e ações previstas passem a ser aplicadas para que as mudanças positivas aconteçam, de fato, e por toda a cidade.

Diante dos inúmeros desafios que encontramos ao nos deslocarmos a pé pelas cidades através de uma rede desigual, descontínua, com infraestrutura de baixa qualidade, insegura e desproporcional, fica evidente o descaso do poder público com a mobilidade a pé e de como esta vem sendo negligenciada ao longo das transformações que acontecem na cidade. A longa demora para a regulamentação do Estatuto também sinaliza o quanto este caminho ainda será construído através de muita luta, para que os espaços de deslocamento na cidade sejam readequados e passem a evidenciar a prioridade de deslocamento a pessoas a pé.

Essas mudanças ganham força através de algumas condições que são apresentadas pelo Estatuto. São muitos aspectos positivos, e que refletem sua construção junto à sociedade civil. É importante destacar que, sobre alguns desses pontos, ainda não há clareza sobre como serão desenvolvidos ou monitorados — e tampouco está estabelecido prazo para que sejam realizados. Por isso, ainda há muito a ser qualificado. A seguir, elencamos alguns pontos que representam grandes avanços para a pauta:

  • a criação de um Sistema de Informação sobre Mobilidade a Pé (Art. 8º), que consolidará em uma base única dados e informações estatísticas sobre circulação, rede de infraestrutura, ocorrência de mortes e lesões no trânsito (acidentes) e outros que possam subsidiar pesquisas, criação, revisão e planejamento de políticas de mobilidade com maior qualidade e fidelidade ao contexto local — além de facilitar a pressão sobre o poder público para adequação e monitoramento de diversas questões. O Sistema também será disponibilizado para consulta pública;
  • a previsão para um Sistema de Sinalização para Pedestre (Art. 9º), constituída a partir da construção de uma orientação indicativa focada nos deslocamentos a pé. Informará também sobre a localização das linhas de transporte público e equipamentos sociais e edifícios históricos próximos. Até então, o sistema de sinalização orientativa existente é focada apenas no trânsito de transportes motorizados;
  • a revisão e atualização de parâmetros relativos à travessia de pedestres (Art. 11º), como aumento no tempo para realizar travessia de vias e tempo máximo para espera da mesma, determinado em até 90 segundos. A adequação, que reconhece a multiplicidade de pedestres e condições variadas de mobilidade a pé na cidade, será feita a partir de novo padrão de velocidades para cálculo, estabelecidos para diferentes perfis. Dessa forma, será possível aumentar a segurança durante travessias;
  • fiscalização das regulações estabelecidas para o uso do espaço de deslocamento a pé por empresas concessionárias de serviços públicos (Art. 16º), que deverá respeitar as condições determinadas, de modo a garantir livre trânsito e segurança para pedestres, assegurando acessibilidade universal e padrão técnico definido pelo Manual de Desenho Urbano, sob pena de multa; e
  • participação ativa e colaborativa da população na formulação de políticas públicas voltadas para pedestres (Art. 20º), reforçando a importância de espaços de debate e processos colaborativos, para atender às reais necessidades das comunidades.

Esperamos que a regulamentação do documento que visa garantir e consolidar a caminhada como meio de transporte de fato traga mudanças efetivas — e que sirva de inspiração para as outras cidades. Em um momento delicado imposto pela pandemia da Covid-19 neste ano de 2020, a mobilidade a pé ganhou nova atenção, um sobressalto no entendimento desta como precaução para deslocamentos (possíveis) mais seguros. Que também possamos fazer mais, durante este período crítico e em todos os outros bons ainda porvir.

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Como Anda é o ponto de encontro de organizações que promovem a mobilidade a pé no Brasil, um projeto em desenvolvimento desde janeiro 2016 pelas organizações Cidade Ativa e Corrida Amiga através do apoio do iCS. Na sua terceira fase (2019–2020), o projeto está investigando experiências de incidência política na mobilidade a pé em todo o Brasil e lançou uma publicação refletindo esse cenário de experiências: Andar a pé eu vou.

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